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  • Foto do escritorVerônica Daniel Kobs

BREVIÁRIO DAS MÍDIAS VINTAGE, VOLUME I

Atualizado: 12 de mai. de 2023

Neste mês, começamos um texto seriado que será publicado aqui, mensalmente. O objetivo é resgatar meios de comunicação que atualmente são considerados fora de moda, mas que, em outras épocas, fizeram uma verdadeira revolução no que diz respeito à escrita e à leitura, em diversos aspectos: produção, divulgação e acessibilidade. Além disso, esse tema gera bastante curiosidade hoje em dia e tudo o que é vintage costuma ter uma legião de seguidores. No entanto, é preciso mencionar que para ser vintage não pode ser algo de nosso passado recente. Digo isso porque, há algumas semanas, eu estava assistindo a um episódio de Trato Feito e alguém tentou vender “um pôster vintage da Gisele Bündchen”. Acertadamente, Chumlee corrigiu a informação, afirmando que o produto não era vintage, porque tinha sido feito no início dos anos 2000. Exato, e é claro que isso diminuiu bastante o valor que o desavisado e infeliz vendedor pretendia pedir pelo tal pôster.

Felizmente, posso dizer que conheci diversos tipos de mídias que hoje são consideradas vintage e acho importante contar e registrar um pouco desta história − que não é só minha, mas de todos nós. Sim! Trata-se de uma História com H maiúsculo, como dizíamos antigamente, já que nada do que temos hoje seria possível sem os aparelhos e as ideias daqueles que vieram antes de nós. É um movimento contínuo e evolutivo...

Vamos começar pelos fichários das bibliotecas. Antes do Google e de outros buscadores, a pesquisa era feita manualmente. Aqueles que liam e visitavam frequentemente as bibliotecas já sabiam qual era o procedimento e tratavam de localizar logo o enorme fichário (Fig. 1):


Figura 1: Exemplo de fichário usado antigamente, nas bibliotecas.


Havia muitas fichas, milhares delas, e todas eram organizadas alfabeticamente, por autor, título ou por assunto. Claro que era preciso ter em mãos papel e caneta, para, depois de encontrar as fichas dos livros que interessavam, anotar o código completo. Com esses dados, o leitor podia circular livremente entre as estantes e localizar, enfim, a obra desejada! Em muitos casos, era necessário fazer fotocópias de alguns trechos. Pensei sobre isso recentemente e me surgiu uma dúvida: “Será que o serviço de fotocópias ainda é oferecido nas bibliotecas físicas?” Fui a uma biblioteca física pela última vez lá pelo ano de 2010 ou 2011 e as fotocopiadoras ainda estavam lá... No entanto, hoje, imagino que os frequentadores preferem tirar uma foto, com o próprio smartphone, e sem pagar nada.

É claro que, de muitos modos, as buscas que podemos fazer hoje, na Internet, garantem acesso a materiais às vezes muito raros ou indisponíveis na biblioteca física. Várias vezes eu precisei de dicionários ou de livros de arte, imensos e com encadernações luxuosas, em alguns casos, mas o empréstimo não era permitido. Essas obras faziam parte da chamada consulta local e esse era o pesadelo de muitos frequentadores de bibliotecas.

Outro instrumento muito usado nas bibliotecas eram (e ainda são) os leitores de microfilmes (Fig. 2), registrados como invento em 1859. Girando apenas um botão, podemos folhear um jornal, por exemplo.” Mil livros no espaço de um caderno. [...]. Se pensou nos e-books, errou [...]. O segredo está naquela maquininha que talvez você tenha notado numa biblioteca, parecendo um computador realmente velho. É uma peça totalmente analógica, mas que ainda pode salvar o futuro da ignorância” (AVENTURAS NA HISTÓRIA, 2023). Além disso, apesar de ser um aparelho bastante antigo, nenhum ainda foi capaz de superá-lo, em termos de segurança de dados: “O microfilme é a forma de armazenamento mais segura quando falamos preservação de documentos. É [...] inviolável, não permitindo alterações, adulterações ou fraudes” (ACERVO NET, 2023).


Figura 2: Máquina leitora de microfilmes. Imagem disponível em: https://br.ebay.com/b/Minolta-Microfilms-Microfiches/61673/bn_17644747



Nos anos 1980, os cartões perfurados eram um sinal de progresso e avanço tecnológico. Quando eu era pequena, sempre ia às lotéricas com minha avó e lá fazíamos nossas apostas. Diferente de hoje, quando temos inúmeros tipos de jogos e concursos, antes tínhamos apenas a Loto, conhecida popularmente como Loteca. Marcávamos os cartões à caneta, mas, como comprovante, recebíamos o famoso cartão perfurado (Fig. 3). De fato, as máquinas já sinalizavam seu império, tanto que alguns artistas exaltaram os cartões perfurados como principal marca dos novos tempos e da urbanidade (Fig. 4):


Figura 3: Cartão perfurado usado para apostas, nos anos 1970-80.


Figura 4: Poema “Cidade”, de Ana Aly, no qual os cartões perfurados são usados como fachadas iluminadas dos prédios. Imagem disponível em: http://gramatologia.blogspot.com/2009/12/vincent-geneslay.html

Usados sobretudo como recursos didáticos, o retroprojetor e o projetor de eslaides eram muito usados nas escolas (Fig. 5). O chamado passador de eslaides tinha um botão que permitia visualizar a imagem seguinte. No entanto, o queridinho dos professores (muito antes do data show, do PowerPoint e do Google Slides) era o que carinhosamente chamávamos de retro (sim, ele tinha até um apelido). Isso mesmo: o conteúdo era escrito em uma lâmina de plástico (chamada transparência), mas era preciso usar uma caneta especial. A vantagem é que o material aceitava conteúdo impresso ou manuscrito. O mais comum era preencher as transparências à mão, mas precisávamos ter a tal caneta para retro, hoje conhecida como caneta para CD! Comprei uma dessas recentemente, em uma das livrarias físicas que ainda existem em Curitiba. Além disso, assim como era nos primórdios do data show, o retroprojetor e o passador de eslaides não exigiam uma tela branca (nem do modelo fixo, nem daquelas retráteis). Bastava ter uma parede livre, de preferência branca e, por essa razão, nas escolas, os professores tentavam sempre manter uma parede livre, nas salas de aula, sem avisos ou atividades.



Por falar em eslaides, havia ainda um visualizador manual (Fig. 6), em que podíamos inserir um disco de imagens e acionar um botão, para fazer o disco rodar, a fim de poder ver todas as cenas. Quando eu era pequena, ganhei um dos meus tios e o guardo até hoje! É uma lembrança afetiva para mim, pois eu me transportava para um mundo de fantasia, durante horas, maravilhada com as imagens de araras, flamingos e cacatuas. Havia 14 imagens em cada disco. A cada clique, o disco girava e uma nova imagem aparecia. Eu assistia ao mesmo disco várias vezes. Meu tio e minha tia viajavam o mundo todo e isso completava o exotismo daquelas imagens, na minha mente de criança. Assim, eu costumava pensar que um dia, quando crescesse, eu poderia conhecer aqueles lugares e aqueles animais!


Figura 6: Visualizador manual de disco de eslaides.


No meu tempo, usávamos também o papel carbono, preto ou colorido. Era uma ótima alternativa para fazer cópias. Bastava colocar um carbono entre duas folhas, escrever ou datilografar sobre a primeira e pronto (Fig. 7). Mas atenção ao verbo datilografar, que muitos, como os personagens da série Paranoid (que eu não indico!), hoje usam como sinônimo de digitar. Não mesmo! São duas coisas diferentes, associadas a duas mídias distintas: a máquina de datilografia e o computador.


Figura 7: Usando o papel carbono para produzir cópias de modo simples e totalmente manual. Imagem disponível em: https://pt.aliexpress.com/item/1005002029921139.html


Geralmente, o carbono era usado no comércio. Os blocos de nota fiscal já traziam o carbono, às vezes até na cor vermelha. Isso era muito prático, pois, ao preencher apenas uma via, a do cliente, o comerciante também já fazia sua própria cópia, para usar depois, nos balanços mensais. Já era 2010 ou 2011, quando resgatei essa moda vintage, em uma das universidades em que trabalhava. As bancas precisavam preencher três vias do parecer e, em algumas ocasiões, usei o carbono. Os colegas elogiaram a praticidade e lembraram com nostalgia os tempos em que esse recurso era usado cotidianamente.

Ainda melhor que o carbono era o mimeógrafo, que, inclusive, foi usado também no período da Poesia Marginal, em 1960, quando os autores escreviam à mão ou datilografavam os textos, e rodavam algumas centenas de cópia no mimeógrafo, usando apenas papel sulfite, álcool e um estêncil. Isso quer dizer que o custo era barato e permitia uma boa divulgação. Depois, os próprios autores iam às ruas e aos bares distribuindo sua obra àqueles que respondiam “sim” quando ouviam a pergunta: “Você gosta de poesia?”

No estêncil (Fig. 8), cujo nome técnico é papel hectográfico, fazíamos uma espécie de matriz e, como o carbono, também havia colorido. Além disso, era possível usar o mesmo estêncil, escrevendo por cima, como costumávamos dizer. Quando dei aulas em um Jardim de Infância, usávamos semanalmente. Rodei muitas atividades para meus aluninhos, usando o mimeógrafo (Fig. 8). Bastava girar a manivela... Lembro até hoje que as folhas saíam úmidas e com um forte cheiro de álcool. Por isso, podiam borrar. Era preciso espalhá-las pela sala, até secarem.


Hoje, porém, o estêncil ganhou um novo uso e passou das salas de aula para os estúdios de tatuadores, que usam o recurso para marcarem com nitidez e perfeição, na pele dos clientes, o desenho escolhido para a tatuagem.

Gostou de conhecer um pouco mais sobre a história das mídias? Então, não perca o segundo episódio desta série, no mês de março, aqui, no Blog Interartes: Artes & Mídias.


Gostou deste texto? Então, leia mais em: Mídias1, Mídias2, Mídias3, Mídias4 e Mídias5


REFERÊNCIAS

ACERVO NET . Saiba como funciona a digitalização de microfilmes. [Sem data]. Disponível em: https://acervonet.com.br/blog/saiba-como-funciona-a-digitalizacao-de-microfilmes/. Acesso em: 7 fev. 2023.

AVENTURAS NA HISTÓRIA. Microfilme: entenda como primitivas fichinhas podem salvar o mundo. 27 jun. 2021. Disponível em: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/almanaque/microfilme-entenda-como-primitivas-fichinhas-podem-salvar-o-mundo.phtml. Acesso em: 7 fev. 2023.

GUIRALDELLI, W. Você já viu um mimeógrafo funcionando? 17 mai. 2016. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=cHHW95JSH5E. Acesso em: 7 fev. 2023.

PARANOID. Direção: John Duthie et al. GB, 2016. Netflix; Netflix (Temporada 1; 8 episódios).


Versão ampliada do texto publicado no blog Recorte Lírico, em 9/2/23.


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* Verônica Daniel Kobs: Professora do Mestrado e do Doutorado em Teoria Literária da UNIANDRADE. Professora do Curso de Graduação de Letras da FAE. Autora do blog Interartes (https://danielkobsveronica.wixsite.com/interartes). Em 2018, concluiu o Pós-Doutorado na área de Literatura e Intermidialidade, realizado na UFPR.

Caso deseje comentar o texto que você acabou de ler, basta escrever para danielkobs.veronica@gmail.com. Será um prazer conhecer sua opinião.

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